Leo Kanner e a primeira descrição do Autismo
Esta perturbação foi primeiramente descrita por Leo Kanner em 1943, quando reportou 11 casos que aparentavam exibir “um distúrbio inato no contacto afectivo”. Com esta descrição, Kanner queria dizer que, em contraste com bebés normais, estas crianças vinham ao mundo sem um interesse normal pela interacção com outras pessoas. O autor acreditava também que a dificuldade destas crianças com autismo em lidar com o mundo social era congénita, ou seja, as crianças nasciam com esta mesma dificuldade e fez então as primeiras descrições dos comportamentos invulgares das mesmas (Volkmar, 2009):
- Mencionava que estas crianças exibiam “resistência à mudança”. Com isto Kanner queria dizer que a criança poderia requerir aos pais que fizessem sempre o mesmo caminho para a levar à escola e ficava muito perturbada se tal não acontecesse. Entrava em pânico também, se visse que alguma coisa no seu quarto estava fora do lugar;
- Quanto à linguagem, a criança com autismo não conseguia dar um tom apropriado ao seu discurso (ex.: fala como um robot), poderia ter uma linguagem com ecolália ou confundir pronomes pessoais. Por exemplo, quando questionada se queria uma bolacha, a criança respondia, “quero bolacha, quero bolacha, quero bolacha”.
Kanner afirmou também que existiam dois pontos essenciais para diagnosticar o autismo:
- Isolação social;
- Comportamentos invulgares ou resistência à mudança.
Nos dias de hoje, temos quatro grandes características do autismo (Volkmar, 2009):
- Fraco desenvolvimento social, de um tipo ligeiramente diferente das crianças normais;
- Fracas capacidades linguísticas e comunicacionais;
- Resistência à mudança, que se reflecte nas rotinas inflexíveis, nos maneirismos, estereotipias, e outras singularidades comportamentais:
- Os sintomas expressam – se nos primeiros anos de vida.
Crianças com Autismo na escola
Antes de 1975, os pais eram informados pela escola que não havia nenhuma maneira de educarem os seus filhos. Muitas das vezes, eram aconselhados a colocar a criança numa instituição onde poderia usufruir de alguma intervenção. Somente uma pequena proporção das crianças era instruída em escolas públicas (Volkmar, 2009).
Hoje em dia existe uma visão completamente diferente onde as escolas são obrigadas a providenciar uma educação apropriada e gratuita para todos os indivíduos com deficiências. À medida que os programas se tornam cada vez mais sofisticados, as escolas têm realizado um trabalho mais eficaz no que diz respeito ao ensino de crianças autistas. Isto significa que as escolas são agora o principal local de intervenção para o autismo. Como resultado, cada vez mais crianças estão a ser identificadas nas escolas e a receber serviços e, mais importante, parece também que as crianças autistas mostram melhorias quando integradas num grupo, como é uma turma (Volkmar, 2009).
Causas genéticas do Autismo
Um artigo de Susan Folstein e Michael Rutter (1977) concluiu que o rácio de autismo em gémeos idênticos (monozigóticos) era muito maior que em gémeos dizigóticos. Os gémeos monozigóticos têm genes idênticos, enquanto que os gémeos dizigóticos partilham somente alguns genes. A implicação desta descoberta é de que existe uma forte contribuição genética para o aparecimento do autismo (Volkmar, 2009).
Estudos com neuroimagem
Autópsias e estudos de neuroimagem têm sugerido que alguns indivíduos com autismo têm um tamanho cerebral aumentado e que esta condição se tende a desenvolver no primeiro ano de vida. Outros estudos têm posto a hipótese de que existem algumas alterações na estrutura cerebral, particularmente nas partes do cérebro que processam informação emocional e social (sistema límbico) e no cerebelo (parte do cérebro que ajuda a coordenar e a controlar o movimento) (Volkmar, 2009).
Intervenções Educacionais
Os indivíduos com perturbações do espectro do autismo (PEA) precisam de ajuda em várias áreas do seu desenvolvimento. As áreas de intervenção abrangem todas as características do autismo – défices na comunicação e na interacção social – mas incluem também outros problemas tal como a linguagem. As estratégias precisam de incluir problemas de fracas capacidades de organização, que podem ser um obstáculo a uma aprendizagem eficiente. Enumeram – se agora as prioridades da intervenção (Volkmar, 2009):
- Capacidade de desenvolver uma comunicação espontânea e funcional;
- Aumentar as capacidades para brincar e jogar com o grupo de pares;
- Reforçar o crescimento em termos cognitivos e académicos, incluindo um grande número de habilidades como resolver problemas;
- Intervenções comportamentais positivas para problemas de comportamento;
- Capacidades académicas funcionais e sua integração no contexto escolar.
O grande objectivo é ajudar o indivíduo a adquirir tantas capacidades quanto possível para que, posteriormente, na idade adulta, lhe seja permitido ser produtivo e auto – suficiente (Volkmar, 2009).
Intervenção na capacidade de socialização
- Intervenção no ensino pré – escolar
Para uma criança típica de 3 anos, a linguagem é utilizada para brincar e para resolver conflitos com outras crianças. Mesmo para as crianças com perturbações do espectro do autismo (ex.: Asperger) que aprendem a falar cedo e que têm um bom vocabulário, o uso social da linguagem representa um problema. Por exemplo, uma criança com PEA pode não estar apta para participar em brincadeiras mais cooperativas sem ter o suporte de um adulto (Volkmar, 2009).
De todas as intervenções nesta área, as mais recomendadas são aquelas baseadas no grupo de pares. Estes programas de intervenção são mais eficazes se o professor for capaz de planear os materiais e actividades tendo em conta a criança em causa. Actividades que tenham um fim natural poderão ser mais favoráveis, e inicialmente estas devem minimizar a necessidade de espera e de partilhar para dar à criança a oportunidade de aprender através da observação, sem se envolver em conflitos por causa do material (Volkmar, 2009).
Os pares são os agentes primários da mudança. Originalmente, esperava – se que expor a criança autista ao seu grupo de pares seria suficiente, mas rapidamente se percebeu que a eficácia era pouca. Assim foi criada uma intervenção em que os pares seriam os “organizadores” das brincadeiras/jogos e trabalhavam assim a partilha, a ajuda, a capacidade de dar afecto e o elogio.
É difícil para os pais, e ocasionalmente para os professores, compreenderem a importância das brincadeiras/jogos no desenvolvimento da criança. Para uma criança normal, a capacidade para brincar desenvolve – se sem instrucções formais e existe uma sequência normal na manipulação dos objectos (mover um carrinho) e na imaginação (levar o carrinho num viagem imaginária ao jardim zoológico). Esta capacidade tem raiz no desenvolvimento social e na comunicação, ajudando assim a desenvolver outras capacidades cognitivas e simbólicas. Ao contrário das crianças ditas normais, as crianças com perturbação do espectro do autismo têm de aprender esta capacidade de brincar (Volkmar, 2009).
- Intervenção com crianças em idade escolar
No desenvolvimento normal da criança, a mudança da pré – escola para a escola primária envolve uma mudança em que a interacção entre os pares deixa de se focar nas brincadeiras e passa a focar – se em interesses e actividades específicas (ex.: jogos com regras). Costumam desenvolver – se nesta fase amizades mais intensas e a criança com autismo pode sentir – se isolada. Como resultado destas diferenças, as intervenções nas capacidades de socialização tendem a envolver adultos ou métodos híbridos (grupos onde adultos e crianças estão presentes) (Volkmar, 2009). Pode ser assim utilizado suporte visual para facilitar alguns aspectos da interacção social incluindo assim sequências de imagens, regras escritas ou o desenvolvimento de histórias e narrativas; como sempre, estes suportes devem ser apropriados aos níveis individuais de habilidade cognitiva e comunicativa. Estas variadas estratégias, combinadas com técnicas comportamentais, podem ser utilizadas para desenvolver a consciência social, ajudando as crianças a tornarem – se melhores observadoras das interacções sociais e respectivas regras (Volkmar, 2009).
A utilização de rotinas regulares, atenção cuidada ao ambiente e estrutura da turma e coordenação com a psicóloga escolar e a família pode providenciar um grande suporte aos alunos com autismo. Neste ambiente, podem ser ajudados a generalizar algumas habilidades aprendidas nas intervenções e assim obter feedback de um adulto significativo. É essencial que os professores reconheçam que o funcionamento social é uma área em que os alunos autistas precisam de especial atenção (Volkmar, 2009).
- Intervenção social com adolescentes e adultos
Infelizmente, por esta altura, os pares já se desenvolveram drasticamente no que diz respeito a interacções sociais, e assim já não é possível utilizar métodos que envolvem o grupo de pares (Volkmar, 2009).
Nestas fases do desenvolvimento, a linguagem torna - se o meio primário para a interacção social, portanto é preciso prestar especial cuidado às “regras” sociais da linguagem. O humor, as anedotas, a ironia e o sarcasmo podem ser difíceis de ser compreendidas pelo adolescente autista. Mesmo o tom e o volume da voz são áreas problemáticas. Felizmente, existem algumas vantagens nesta fase do desenvolvimento, a interacção gira à volta da Internet e do telemóvel (Volkmar, 2009).
A intervenção pode basear – se em roleplays que ensinam a “ler” as pistas sociais dadas pelos pares. São também utilizados para praticar interacções de uma maneira mais segura, de forma individual com o aluno ou em grupo. Os roleplays são particularmente eficientes em grupos pois dá a oportunidade para obter feedback, o que por sua vez validará e reforçará observações feitas na intervenção indidual (Volkmar, 2009).
Em suma, é importante que os pais e os professores permaneçam focados na criança em particular e nas suas necessidades. É também igualmente importante que pais e educadores trabalhem em conjunto no desenvolvimento de um plano individualizado que albergue todos os pontos fortes e pontos fracos da criança (Volkmar, 2009).
Ver também:
www.youtube.com/watch?v=kNL1ZhpSGdI
autismos.net/a-crianca-autista.html